Entre “Um
Festival de Incertezas” e “Ideias Para Adiar o Fim do Mundo”
Refletir sobre a natureza complexa da vida e da
existência humana não é um exercício minimalista, ou simplório. Nem sempre
estamos preparados para o mergulho interior necessário para nos provocar a
pensar e desconstruir verdades que considerávamos inabaláveis. Nós estudamos
História e observamos os cenários devastadores das guerras como espectadores
diante de um filme. Sinto que minha
geração, em sua maioria, não conseguimos sentir cortar a nossa própria carne e
nem consideramos isso necessário.
Perante a leitura do artigo “Festival de
Incertezas”, e esta fala fortemente provocativa como todo constructo filosófico
de Edgar Morin:
"É TRÁGICO que o pensamento disjuntor e
redutor
reine soberano em nossa civilização
e detenha
o comando tanto na política e na economia."
Questiono-me, qual é o meu, o seu, o
nosso papel como protagonistas das incertezas e do caos? Remeto-me a obra do
Ailton Krenak, Ideias Para Adiar o Fim
do Mundo, penso, em que momento nos distanciamos tanto da nossa condição de
humanidade? Pergunto-me que espécie de " humanidade" é essa defendida
pela perspectiva imperialista, neoliberal e excludente.
Nosso tempo é especialista em criar ausências:
do sentido de viver em sociedade, do próprio sentido da experiência da vida.
Isso gera uma intolerância muito grande com relação a quem ainda é capaz de
experimentar o prazer de estar vivo, de dançar, de cantar. E está cheio de
pequenas constelações de gente espalhada pelo mundo que dança, canta, faz
chover. O tipo de humanidade zumbi que estamos sendo convocados a integrar não
tolera tanto prazer, tanta fruição de vida. Então, pregam o fim do mundo como
uma possibilidade de fazer a gente desistir dos nossos próprios sonhos. E a
minha provocação sobre adiar o fim do mundo é exatamente sempre poder contar
mais uma história. Se pudermos fazer isso, estaremos adiando o fim (KRENAK,2019)
Estamos dispostos a nos alistar na luta por
justiça social e equidade? Estamos abertos a sonhar, dançar na chuva, escutar o
som da mãe terra? Somos formados para planejar nossos currículos com emaranhados
de conteúdos para uma realidade de incertezas? Nos questionamos, como o
conhecimento científico ganha sentidos e significados em pleno “FESTIVAL DE INCERTEZAS”? É possível
reconhecermos a ciência como caminho para nossa humanização, de transformação
social e produção de novos estilos de vida, de consumo, de produção?
“Esta é a ocasião para compreender
que a ciência, diferente da religião,
não tem um repertório de verdades absolutas
e que suas teorias
são biodegradáveis sob efeito
de novas descobertas “
A Educação para o século XXI, mais especificamente o
espaço escola precisa se constituir como Residência de Aprendizagem
Colaborativa, espaços multidisciplinares de estudos de caso, pesquisa, leitura,
construção do conhecimento científico, contação de história, danças, canais no
youtube etc, tudo que a criatividade humana for capaz de desenvolver numa
perspectiva holística e integradora, mas, sabemos que não basta
reconfigurar o espaço-escola, é preciso fortalecer como princípio básico uma
nova estrutura econômica e política.
Pensar a economia por outras perspectivas
envolve caminhos que perpassam por uma educação para conhecer o neoliberalismo
em seus efeitos nefastos. Reconfigurar os padrões de consumo, os iderios de
riqueza, o conceito capitalista de felicidade.
Para tanto, é necessário nos educar interiormente para promover
ambientes catalizadores de aprendizagem e engajamento, para
a construçao de novos cenários, assim pode ser que seja possível,
"Adiar o fim do mundo" apesar do cotidiano nos colocar sempre frente
a este "Festival de Incertezas."
"Na carência dos poderes
públicos, identifica-se também uma profusão de imaginações solidárias: produção
alternativa para a falta de máscaras por empresas reconvertidas ou por
confecções artesanais, reagrupamento de produções locais, entregas gratuitas em
domicílio, ajuda mútua entre vizinhos, alimentação gratuita aos sem-teto,
cuidado das crianças. A mundialização criou uma
interdependência, mas sem que tal interdependência fosse acompanhada de
solidariedade”
Em suma, como nos propõe Ailton Krenak,
Certamente os povos indígenas e tradicionais podem nos guiar através de sua
experiência, não apenas de sobreviver, mas de reconstruir pela natureza a
orientação para a vida, “uma nova humanidade” Penso que a educação em
redes colaborativas e a economia solidária apresentem-nos novos mundos
possíveis.
KRENAK, Ailton. Ideias para Adiar o Fim do Mundo. Companhia das Letras. São Paulo, 2019.
Esta edição eletrônica do livro Um Festival de Incertezas de Edgar Morin foi produzida no dia 21 de abril de 2020 pela editora Gallimard.Disponível em: http://www.ihu.unisinos.br/78-noticias/599773-um-festival-de-incerteza-artigo-de-edgar-morin
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